segunda-feira, 26 de março de 2012

Aprendi a ter saudade

       


       Recebi um e-mail de um amigo que não vejo há um ano - o que é pouco tempo considerando-se que ele e sua família toda moram na África do Sul. Nossa história é muito bonita. A história de nossas famílias é muito bonita! Imaginem vocês, a minha mãe Nini, com três filhas miuditas (5, 3 e um aninho), no florescer dos seus 25 ou 26 anos, esposa de um barbeiro que trabalhava de domingo a domingo (nos domingos até a hora do almoço), ganhar como vizinha - e melhor amiga - uma espanhola vibrante chamada Teresa (que se fosse baiana diríamos "arretada"), daquelas de pegar o touro a unha, com um moleque de um ano a andar e outro a espernear-lhe por dentro da barriga, dois cunhados, mais sogro e sogra (tudo juntinho na casa ao lado da nossa, uma casa de dois quartitos, sala, cozinha, banheiro e, sim, um quintal!)! 
        Pois é, como bem disse meu amigo: uma não falava a língua da outra! Mas, o carinho, o afeto, a amizade, o amor, são universais, não precisam de uma língua específica: falam por si, nos gestos, nos olhares, nos sorrisos. Daí vai se aprendendo o que menos importa: o idioma. E ele se torna um complemento, uma ferramenta, um instrumento para enfeitar de mimos os laços que o carinho construiu. Foi assim com as duas mulheres. Foi assim com as duas famílias. Ah, a família do lado cresceu: além do loiríssimo Francisco (que os pais chamavam de Paco e nós chamávamos de Paquinho), nasceu o esperneador Julio (que chamávamos de Julinho, e não se esqueçam que, em espanhol, a letra jota tem o som da letra erre, portanto, na família ele era "Rúlio" ou "Rulito") e nasceu João Carlos (nós sempre o chamamos assim: João Carlos, mas, para a família "Ruan"!). Três homens, eles diriam três "hombres". Na minha casa, três meninas, eles diriam três "niñas".
        Paco, o mais velho, era da mesma idade que a minha irmã caçula, mas isso não impediu nem um pouco que todos nós formássemos uma espécie de gangue. Dava para criar muitas brincadeiras. Pra ser bem sincera, como sempre fui a mais frouxa, a mais medrosa, a cagona mesmo, as melhores aventuras aconteceram entre Paco, Clarinha e Zezé. O trio era do forrobodó! Para terem uma noção, Zezé aprendeu a jogar uma senhora bola de gude: um espetáculo, pelo menos pra mim que não entendia lhufas (aliás, ainda ontem, sentei no chão para "ensinar" o meu neto a "segurar" e dar o"teco" na bolinha parada  e tudo o que consegui foi rir muito e perder as bolinhas por baixo do sofá!) e Clarinha, não lembro o motivo, conseguiu quebrar o dente da frente de Paco com uma pedrada! Ou seja, Paco arrumou companhia para suas brincadeiras, mas pensando bem, creio que ele saiu no prejuízo! Rsssssssssssss
         Lamentavelmente, a gangue teve que ser desfeita: seu pai (ainda penso que a alma deste homem é de um cigano) resolveu ir para a África do Sul tentar uma vida melhor. Com a profissão que tinha (ferramenteiro) fez umas pesquisas e concluiu que seria mais vantajoso. Nesta época, Paco tinha somente dez anos. Fomos todos levá-los ao porto. Bem vestidos e cheirosos. Curiosos para descobrimos como seria um navio de perto: coitados de nós, nada vimos!
        Bom de criança é que ela não entende e nem percebe muito do tempo das despedidas, a não ser quando é de pai ou de mãe. Para criança, partir é apenas ansiar por aventuras e novidades. E embora os carocinhos no meu peito denunciassem a minha transformação aos doze anos, dizendo-me que já não era exatamente uma criança, eu também ainda não era nada além disso. E, a criança que eu ainda era, tinha outros sentimentos no peito e não aguardava novidades e aventuras como as crianças que partiam para a África do Sul: sentia desconforto, um desconforto trazido pela ausência, um desconforto que se transformou em melancolia e que, mais tarde, aprendi a chamar de saudade.

       Cléa Siqueira


22 comentários:

  1. Adorei o "cagona"....rs...rs...sua histórias sempre são tão gostosos de ler...
    Bjocas

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    1. Mas, é a mais pura verdade: sou e sempre fui CAGONA!!! rsssssssssss Tinha até medo de subir em cadeira, imagina!
      Se vc gosta de ler minhas histórias, não me abandone (rssssssssss): tem uma penca delas! Obrigada!
      Bjssssssssss, quérida!
      P.S.: Tá se cuidando? Olha lá, hem? Repouso!

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  2. Que história tão linda essa...

    Bendita seja a dona internet que vem dando um jeito de trazer mais pra perto gente que a gente perdeu pelo mundo, né?

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    1. Bendita seja mesmo, Renata! Já fui salva pela D. Internet algumas outras vezes. Ainda contarei sobre isto!
      O importante é usá-la para bons momentos, como nós vamos fazendo!
      Bjsssssssssssss, quérida!

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  3. Cléa querida, que delicia relembrar a infância, das brincadeiras, a amizade pura e descompromissada, a ingenuidade misturada a montes de traquinagens , trazendo belas recordações, e o melhor de tudo ainda ter um vínculo com os amigos de longa data, e garantir uma amizade por toda a vida. Adorei o seu relato,muito gostoso de se ler e emocionante. Bjos querida ótima semana

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    1. Oi, linda Josy, para nós, que tivemos a infância da brincadeira-aventura (subir em àrvore, correr no quintal, caçar passarinho, essas coisas), é realmente alentador relembrar. E mais ainda ter contato com os contemporâneos, bem, na verdade, membros da gangue! rsssssssssssssss
      Bjsssssssssssss, quérida, ótima semana procê tb!

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  4. Oi Cléa, é a Vi, muito bom quando tínhamos aquela turma de amiguinhos para fazer arte..
    Sempre fui arredia, demorava para fazer amigos, tanto que quando fazia a brincadeira já tinha acabado.
    Depois eu ficava com saudades daquilo que poderia ter feito e não fiz, pode?
    Moral da historia: Uma pessoa tímida sempre perde oportunidade de dar boas risadas e de se divertir.
    Muitos beijos,Vi

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  5. Entendo muito bem esa coisa de ficar com saudades do "que poderia ter feito e não fiz", como entendo! No meu caso, não era só timidez (vc leu a minha postagem sobre ser a filha do meio entre duas meninas?), também era cagaço, como disse no texto aí em cima! Mas como eu queria ter tido a coragem que os outros exibiam! Aliás, até hoje!
    A diferença é que hoje, com a idade que estou, uso a mesma como argumento para ousar, manja? Tipo assim: "eu hem, vou perder o quê? Se me espatifar, qual o problema?" e por aí vou tocando.
    Mas podemos nos divertir sendo platéia, por que não? rssssssssssss
    Bjsssssssssss, quérida!

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  6. Oi Cléa!
    Nossa,que postagem gostosa de ler.
    Me emocionou...
    Fiquei aqui recordando da primeira vez que senti saudade.
    Tinha 10 anos e fui morar no RJ,pois meu pai arrumou serviço por aí.
    Meus avós ficaram em SP,e eu era muito apegada a eles.
    No começo só alegria,mas com o passar dos dias,eu também senti,aquele desconforto,e logo mais fui saber que aquele sentimento incômodo,tinha nome:saudade...e qdo apertava muito,corria escrever uma cartinha pra eles,e qdo chegada a resposta,eu ficava toda feliz da vida!
    Foi uma época de grandes aventuras e emoções pra mim.
    Obrigada por compartilhar pedacinhos de sua vida,que faz a gente recordar lindos e bons momentos.
    Bjs!

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    1. Pois é, Clau, dizem que sentimos saudade porque foi bom demais e eu concordo!
      A saudade incomoda, desatina, nos deixa angustiados e irriquietos, mas só porque o objeto da nossa saudade nos faz um bem enorme e não está mais lá, como esteve.
      É um prazer compartilhar pedacinhos da minha vida, principalmente quando provoca sentimentos tão bons e bonitos em pessoas como você!
      Bjssssssssssssss, quérida!

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  7. Oi Cléa,
    como nos são queridas estas amizades da primeira infância e das outras fases da vida tbém.Ao convivermos com pessoas bacanas, os laços da amizade não se desfazem mesmo que a distância se interponha, deixando nas pontas da amarração essa saudade marcada, fruto de lindas memórias.
    Mais uma pág amorosa deste teu diário cuidadoso.
    Bjkas,
    Calu

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    1. É, Calu, como sempre vc acerta: lindas memórias!
      Felizes nós, que as temos! Às vezes, tento não mergulhar fundo, talvez porque temo sentir tanta felicidade que relute em voltar. Quem sabe?
      Obrigada, querida, muio obrigada.
      Bjsssssssssssssss, quérida!

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  8. Ai mulher,como eu gosto de ler suas histórias,são assim uma espécie de bálsamo,deleite pros meus neurônios.
    Além de que me trazem a memória,recordações da minha própria história.
    Adoro!!!
    bjs
    Patricia Petro

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  9. Vixe,agora que reparei,você conseguiu tirar aquela chatice de palavrinhas borradas que tinhamos que advinhar o que eram e reproduzir,pra conseguir postar o comentário!!!
    Que bom !
    bjs
    Patricia Petro

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  10. Aff,desculpa,esqueci mais uma coisa.
    hahahahaha
    Você me perguntou e eu respondo a isso e outras coisitas que tiveres curiosidade,ok?!
    Eu moro em Petrópolis,quer vir me visitar?
    A casa esta aberta sempre aos amigos,então quando quizer,me liga que a gente combina e faz uma farra porreta por aqui.
    rsrsrsrrs
    bjs
    Patricia Petro

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    1. Estava com saudades da menina do dedo colorido!
      Bom, muito obrigada por gostar dos meus escritos, me faz um bem enorme saber! Escrevo com prazer, na verdade, procuro escrever falando (ui, é possível?), como se estivesse numa roda de prosa. Penso que fico mais próxima.
      Bom, após inúmeras tentativas, apareceu (repentinamente, acredite!) a opção de não mostrar as tais palavrinhas na nova configuração do blog. Fiquei muito feliz, não que me incomode com elas, honestamente, não! É que eu nem sabia que apareciam aqui até a Lúcia Soares me avisar (penso que há quase um mês, ou isso)! Como a maioria das pessoas reclama muito das ditas cujas, fiquei em cólicas para retirá-las: quero que as minhas visitas se sintam acolhidas e não irritadas ao me visitarem, certo? Então, consegui!
      Quando perguntei onde morava é porque já li algo sobre a serra fluminense no seu blog e por conta das fotos de suas plantas, cachorros, essas coisas, que quase sempre dá para ver um quintal a nos chamar (amoooo quintais!), como o da casa da minha filha em Nova Friburgo, daí que fiquei toda assanhada para que fosse lá: poderia dar-lhe um abraço ao vivo e a cores mais rapidamente, né?
      Obrigada pelo convite e o meu apê, aqui em Pavuna city, tb está aberto aos amigos!
      Bjssssssssssss, quérida!

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  11. Minha linda Flor Cléa de maracujá doce ri muito com seu comentario sobre o alho poró, pois saiba que eu já conhecia o alho poró, mas passei a usá-lo somente a uns 8 anos atrás, menina, compre e experimente, ele vai bem em todos os pratos, usa-se sómente a parte branca, vc corta em rodelas para fazer uma quiche,ou picadinho com a cebola pra temperar um arroz por exemplo, o sabor e o perfume que exala é dos deuses miga, prove depois me conte, veja no link abaixo o que é o alho poró, tem até algumas receitinhas com ele...Bjocas

    http://hortaeflores.blogspot.com.br/2010/04/receitas-com-alho-poro.html

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    1. Ô que aula, sô! Tb com uma professora porreta dessas, num tem como não aprender, né não? Até alho fica "PORÓ"! rsssssssssssssss
      Bjsssssssssss, quérida e muuuuuuiiito obrigada pela lição!

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  12. Ai ai Cléa, vc faz meu dia mais feliz sabia? As vezes to mucha que nem maracuja véio, e vc vem e deixa comentários no meu blog que me fazem sorrir. Vc tem razão sobre o Maple Syrup, eu desconhecia o que era isso, que mania que brasileiro tem de colocar tudo em inglês né não?? kkkk Bjoquitas

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    1. Que bom Josy, isto me deixa feliz, muito feliz!
      Esse tal de maple Syrup (eu escrevi lá no seu blog, no comentário, "syrub" rssssssssssssss ficou parecendo outra coisa, não foi? rsssssssss) foi muito estranho mesmo! Não era mais simples dizer mel ralo ou mel misturado com laranja? Até pq se é um produto que não temos, teremos que adaptar com produtos que encontramos mais fácil aqui, né não? Complicação desnecessária, né?
      Imagina então pra mim que não sou da área gastronômica? rssssssssssss
      Bjsssssssssss, quérida!

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  13. É, sabe o que isso significa...amor...aprendi recentemente que saudade é o amor que fica..

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    1. Com certeza, querida, com certeza!
      Que linda definição você deu para a saudade (aliás estava com saudade de vc!)!
      Bjssssssssssssss, quérida, Deus a abençoa!

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Muito obrigada por participar do meu blog com o seu comentário.
Bjssssssssssssssssssssssss