quarta-feira, 31 de agosto de 2011

A velha anciã

Há uns dez anos atrás li palavras de uma amiga que diziam "sinto-me como uma velha senhora que já viu e ouviu tanto!". Julguei curiosa a forma como ela se referiu a si mesma, penso até que sequer entendi o real sentido do que dizia. Mas, hoje, lembrei-me do que escreveu. E concluí que me sinto como uma velha senhora, aquela cuja vitalidade se extingue vagarosamente, como a chama de uma vela que, ao faltar-lhe o oxigênio para a combustão,vai diminuindo, encolhendo, apequenando-se.
É como me sinto: frágil. Sei que o meu corpo se fragiliza com as emoções que me invadem, principalmente as emoções que me provocam a raiva, este sentimento medonho mas que vem me frequentando mais vezes do que gostaria que fizesse. Sinto raiva da injustiça, do descaso, do deboche, da ausência, destas coisas que já não deveriam ser tão comuns e banais. E são. Tropeçamos com elas, dormimos e acordamos também.
Como não sentir raiva pela falta de socorro ao cidadão (que construiu casas, sustentou a família levando modesta marmita, que muitas vezes comeu fria , pagou seus impostos - até porque, ai dele se não o fizesse!) que adoece e fica largado no chão do corredor de um hospital público até que venha a óbito súbito sem que se saiba o porquê. Qual a causa? Alguém sabe? Alguém diz?
A família recebe o corpo amado e resta-lhe enterrá-lo sem motivo, sem socorro, porque estava no hospital sim, mas apenas no corredor. Era apenas um corpo adoecido no corredor. E esta família passa a ser a família sem chefe, sem provedor, sem norte, sem sorte.
Dá raiva, muita raiva, que não se sabe pra onde enviar. Daí que o corpo absorve e coleciona mais uma revolta pela invisibilidade do homem quando não há votos em jogo. E esta sensação de manietação e de castração do seu direito, abafa a sua chama que vai se apequenando. Nessas ocasiões, percebo, sinto-me uma velha senhora que já viu tanto, ouviu tanto, que não quer desistir, mas que já se cansa de crer.

Um comentário:

  1. Texto extremamente bem escrito e interessantíssimo! Recomendo a leitura diária desse BROGUI, vale a pena! :p

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